Quando coloquei meus olhos no trailer de Wind Princess, curta nacional que homenageia Hayao Miyazaki e mais especificamente sua obra Nausicaa do Vale do Vento, dirigido por Chris Tex, fiquei impressionado pelo carinho dos envolvidos e o cuidado com cada detalhe.
Em entrevista para o Cinema e Pipoca, Chris fala que a ideia surgiu após uma decepção com a série Buuu, para o Canal Gloob. “Eu tinha me “matado” para fazer 26 episódios, com efeitos 3D, com criança, gato, enfim e, quando acabou, eu achei que ia “estourar” no mercado, ia estar bem e, quando vi, quase não apareceu nada“. E mesmo projetos para festivais e internet contavam com um mercado muito fechado, por isso “decidi fazer algo que fosse para o mundo, só que para isso precisava pegar uma obra já conhecida e tentar dar um brilho, e a obra que ninguém estava explorando era essa, e quando eu li o mangá, eu vi que tem um universo, uma história fabulosa e foi muito pouco explorado”.
Segue abaixo a entrevista na íntegra com o diretor!
Cinema e Pipoca: Vimos após o teaser que todo figurino, armas e etc. foram criados por vocês. Quais destes objetos foi o mais complexo de se recriar?
Chris Tex: O figurino foi um processo bem complicado, porque foram vários fornecedores, então tinha alguém para fazer só o capacete, só a parte de cima, alguém para fazer a calça, outro para fazer as botas e a Mari Martinelli, que é a figurinista, se desdobrou inteira para fazer figurino junto com outros fornecedores, até chegar num resultado bem legal. Desde o começo do projeto eu falei pra ela que uma das coisas que eu acho que esses filmes live-action de animê pecam é exatamente no figurino, porque tudo sempre parece cosplay e ninguém leva para um lance mais realista, como o próprio Star Wars, esses filmes de super heróis da Marvel. Um outro objeto que, sem dúvida, foi muito complexo, é a nave, ela levou vários dias para ser construída porque a gente queria que fosse bem similar com o original só que com algumas adaptações para que a atriz pudesse subir e a gente pudesse pendurar ela por baixo, então a gente teve que pensar em toda a mecânica de como fazer as cenas, porque tem que colocar tanto um tripé embaixo dela para ela ficar alçada, quanto pendurar as asas por cordas. Outro detalhe foi com relação às asas, elas precisavam sair para transportar para o deserto, porque essa nave é gigante e inteira não cabe dentro de um carro nem num caminhão, além disso a gente queria fazer esse efeito de luz dela, para deixar tudo isso mais real então acho que a nave é o grande desafio do filme.
Cinema e Pipoca: Vocês tentaram entrar em contato com o estúdio Ghibli? Eles sabem do projeto?
Chris Tex: A gente ainda não tentou porque eu confesso que eu tinha medo de mostrar o projeto e eles recusarem e depois de todo nosso esforço, por alguma razão eles negarem e ter ido tudo por água abaixo, então eu fiquei receoso por não ter os direitos autorais, mas por mais que seja um tributo, uma homenagem, de repente, se eles vissem antes de eu soltar, poderia causar algum alvoroço. Então eu preferi jogar na internet e fazer com que esse filme ganhe tanta força e chegue até eles com um número de pessoas que estão muito a fim, com um número de likes e vejam que não estamos sozinhos e que isso é realmente uma homenagem. Então por isso eu ainda não entrei, mas espero entrar em breve quando o filme tiver mais força.
Cinema e Pipoca: A equipe foi para o sul do país para gravarem as cenas do deserto. Mas como chegaram até lá e qual era a questão especial para escolhe-lo?
Chris Tex: As chances de a gente ter um deserto no Brasil existia mais pro norte e nordeste, só que a gente não tinha condições de bancar passagem aérea para todo mundo e nem transportar a nave no avião ou barco, então vimos que existe um deserto um pouco menor que os do norte e nordeste do país, que fica no sul, no farol de Santa Marta e que lá, talvez, a gente pudesse fazer as cenas, porque tem um horizonte incrível, o lugar é muito especial, tem o tom da areia que a gente precisava pro filme, que é uma cor meio alaranjada e a gente foi pra lá. Fomos em uma van, com 12 pessoas e a van carregava na parte de trás um caminhão baú, pra levar a nave e os equipamentos de filmagem, mas foi um super “perrengue”, esse caminhão baú que estava grudado na van escapou várias vezes durante a viagem, a gente ficou preso no meio do caminho, aí a balsa que a gente teve que pegar atolou, o motorista que já não estava aguentando a jornada nos abandonou no meio do caminho e tivemos que alugar um guincho. Chegando lá no sul, o hotel que nos hospedou, foi super parceiro e deixou a gente ficar lá, meio que de apoio pro filme e os moradores locais se sensibilizaram com a nossa história, contamos que tínhamos vindo de São Paulo fazer um curta, um filme independente. Eles viram o figurino, viram a nave e se sensibilizaram, mas não tinha como entrar no deserto, porque estava uma tempestade e era impossível andar, então eles pegaram a nave, emprestaram o jipe e os carros deles e a gente conseguiu fazer a filmagem.
Cinema e Pipoca: Quais as principais dificuldades para se tirar um projeto desses do papel?
Chris Tex: Acho que a principal dificuldade que eu enfrento hoje é a pós-produção, porque isso impacta muito no filme. O filme tem muito 3D, muitas cenas de efeito, coisas que ninguém faz aqui no Brasil, não tem um filme que seja feito desse jeito e tudo isso leva dinheiro, a gente até tem profissionais muito bons no país, mas os melhores estão fazendo publicidade ou estão fazendo projetos grandes que não tem tempo para fazer um curta. Então é realmente essa coisa de enfrentar várias dificuldades, achar uma locação, juntar uma equipe, construir a nave, fazer os cenários, arrumar o estúdio, conseguir equipamento de cinema, mas hoje, a pós-produção é o grosso que a gente não contava, que é o que falta para acabar o projeto.
Cinema e Pipoca: Como foi feita a escolha do elenco?
Chris Tex: A gente deu muita sorte, colocamos uma postagem no Facebook falando que precisávamos de meninas de tal idade, ruiva, de tal perfil e etc. e fizemos um teste numa casinha ali perto da Heitor Penteado. A gente foi divulgando que ia fazer o filme e apareceu muitas candidatas boas, dentre elas estava a Jéssica, que é a nossa protagonista, quando eu vi achei perfeita, porque ela tinha um rosto fino, uma boca fina, os olhos grandes e exatamente como a nossa personagem, ela parecia um animê mesmo. Colocamos a roupa nela, desenhando por cima no Photoshop e falamos: “é ela, ela fica perfeita” e foi daí que a gente escolheu.
Cinema e Pipoca: Qual a data de estreia prevista de lançamento para o curta metragem?
Chris Tex: A gente ainda não tem data de estreia porque depende muito de como vamos finalizar esse filme. Acreditamos que depois desse trailer isso pode ganhar força. Eu estou recebendo e-mails de várias pessoas do mundo, de pós-produção, freelas, que estão querendo participar de algum jeito e ajudar a terminar, então, acho que agora a gente está no caminho.
Cinema e Pipoca: Existe a possibilidade de vermos outros animês sendo homenageados futuramente por vocês?
Chris Tex: Eu gostaria muito de entrar nesse universo dos animês que desde criança eu sou apaixonado, desde os três anos eu jogo videogame e desde então assisti Cavaleiros do Zodíaco, Yu Yu Hakusho, Samurai Wars, Dragon Ball, o mais recente Naruto e agora estamos na fase do Boku no Hero. Akira foi o primeiro longa-metragem que eu vi na vida, fui na locadora e vi o cara numa moto vermelha, que por alguma razão aquilo me chamou atenção, eu vi quando criança e me traumatizei totalmente, porque é um filme quase de terror, eu fiquei 10 anos se ver esse filme e quando eu reassisti eu falei: “isso é uma obra prima”. Então eu queria muito, até pensei em fazer o live-action da Akira, mas como já tinha muita coisa sendo feita no mundo eu achei que eu só seria mais um, e quis pegar esses animes, que tem pouca gente explorando. Eu acho difícil homenagear outros por conta do dinheiro, seria muito interessante se de fato alguém visse nosso talento, me chamasse como diretor de uma produção oficial, dirigir lá no Japão, seria um sonho.
Cinema e Pipoca: Fale um pouco sobre o seu portfólio e as obras que já dirigiu?
Chris Tex: Profissionalmente falando, foi um curta metragem que fiz lá pelos meus 21 anos, com os amigos da faculdade de cinema. Este curta passou na Romênia, mas eu fiquei um pouco frustrado pois os festivais de cinema são um pouco restritos e feitos só para o pessoal da área, e como eu tinha feito filme de comédia, eu estava imaginando um filme mais para o público e não um filme mais para os críticos. Por isso resolvi apostar na internet, que é onde estaria o público mesmo, que curte filmes que eu sempre gostei, de sessão da tarde, filmes de gêneros, como comédia, terror, ação, aventura, ficção científica, e a faculdade de cinema te ensina a fazer um filme mais autoral, mais artístico, mais dramático e eu sempre gostei de Steven Spielberg essas coisas, aí eu chamei a mesma galera do curta e a gente fez uma websérie chamada Nerd of the Dead, que é uma série de Nerds Zumbis, na época fez um certo barulho, fizemos totalmente independente, com dinheiro do bolso, fiz uma parceria com o pessoal do Omelete, falei “como sou um cara sem força nenhuma vou colocar no canal deles”. A partir dessa websérie, o cara que estava desenvolvendo e criando a série Buuu pro Canal Gloob viu e me chamou para dirigir. Depois resolvi fazer esse curta do Wind Princess, e no meio dele eu acabei caindo na publicidade, mas esse ano eu voltei mais pro conteúdo, fazendo um filme com o Whindersson Nunes, pro canal dele, ele me convidou falando que queria desenvolver uma ideia de porrada e ação que é a minha praia, a gente sentou, fizemos o roteiro e eu dirigi e produzi e, agora, atualmente, estou fazendo outra série pro Gloob, que é a quinta temporada da Escola de Gênios, e tentando finalizar esse curta.
Cinema e Pipoca: O que você espera com esse novo projeto?
Chris Tex: Gostaria de ser chamado para dirigir uns filmes de ficção científica, aventura, ação, gostaria de mostrar esse potencial meu e da minha equipe, tanto pra fora ou começar a fazer esses tipos de filme aqui dentro, do próprio país, que eu acho que existe um público absurdamente fã, fiel e carente a esse tipo de conteúdo. Então eu gostaria muito que esse projeto me desse a oportunidade de mostrar para as pessoas que a gente consegue fazer coisas muito incríveis aqui e que só falta oportunidade e investimento.
Cinema e Pipoca: Após a finalização desse curta já tem algo por vir? O que os fãs podem esperar?
Chris Tex: Eu ainda tenho muitos projetos que eu queria tirar do papel, que gostaria muito de fazer depois que finalizar esse curta, mas acima de tudo eu quero fazer um longa. Já fiz séries, curtas, publicidade, videoclipe, mas não fiz um longa. Um longa-metragem é o caminho.
Confira o trailer de Wind Princess, curta nacional que homenageia Hayao Miyazaki, e comente com a gente o que achou!