Eduardo Roza é diretor e roteirista do curta Simplesmente um Homem e bateu um papo conosco, que você confere logo abaixo:
Cinema e Pipoca: Como surgiu a ideia do título ‘Simplesmente um Homem’?
Eduardo Roza: Na verdade o filme anteriormente se chamava ‘Casa Vazia’. Havia uma cena principal que se dava numa gigante casa abandonada. O problema foi quando a locação que estava há 5 anos parada e sem ninguém reformando começou a ser ajeitada. O filme tinha uma conexão entre a casa do personagem e essa casa que ele visitava frequentemente na história. Percebeu a diferença entre a ideia inicial e o produto final (isso quem já viu o filme)? Pois é, entre a criação do roteiro e a edição final os processos nascem, morrem, renascem, são obliterados, se transformam. O que era uma coisa se transforma em outra, isso ocorre devido a vários fatores: atores desistem de fazer o filme, locações caem, dinheiro entra, dinheiro sai, situações nonseses, etc.
O título ‘Simplesmente um Homem’ veio porque num tratamento do roteiro, o personagem pensava off na cena final, algumas coisas sobre o momento que vive. O off ficou até o último segundo e eu resolvi tirar, e por um acaso era mencionado o título do filme, aliás esse pensamento só me veio no ônibus no último dia de filmagem. Por que eu tirei a voz off na edição final (essa que você podem ver no youtube)? Porque me ocorreu que tudo das informações dadas já estava ali em imagens. Vi o filme com e sem a voz off 4 vezes cada para ter certeza.
Esse título denota a igualdade entre todos sejam gays, heteros, ou o que for.
CP: É seu primeiro roteiro e direção ou tiveram outros antes dele? Como surgiu a inspiração para escrever o curta Simplesmente um Homem?
ER: Não, devia ser meu vigésimo roteiro escrito na época. Eu tenho pelo menos 40 roteiros na minha mente dos quais eu nunca esqueço, basicamente só preciso sempre tornar a coisa física. Digitar. Digo aqui que é um furacão centrado porque sou como todos os que criam, tenho muitas ideias, mas eu sou muito prático e sempre as desenvolvo de alguma forma. Antes dele eu fiz 3 filmetes ensaios (coisas que fiz com mini DV, sem qualidade, sem ensaios mesmo) e várias bobeiras. Alguns estão no meu canal no youtube: eduardogray.
A idéia: Eu sou gay, mas não gosto muito de escrever sobre coisas gays porque eu acho que a visão fica muito unilaterizada. Esse foi o meu primeiro projeto gay de fato. Eu estava pensando durante um ano como eu poderia escrever algo que atingiria um público específico. Não sei como um hétero recebe este filme, mas sei exatamente como um homem gay recebe. Para alguns é uma fechada no coração. Essa é uma história que ocorre com quase todo gay que conheço/conheci. O mais importante é que ao escrever essa história eu não trouxe elementos meus, não acho um artifício bom escrever só sobre o que você entende como indica Robert McKee em seus livros, acho que o exercício da escritura têm que explorar o desconhecido, o outro. Essa é minha maior dica sobre escrever, isso te faz exercitar outras formas de escrita que não aquela que apenas te deixa confortável, entretanto também acho que é válido escrever sobre seu mundo, para aqueles que acham melhor assim. O ruim disso é ser identificado na obra de forma direta. Pessoas apontam você no roteiro e a última coisa que quero é que alguém me veja na tela seja de qualquer forma.
CP: Quanto tempo durou as filmagens e onde foram feitas as locações do curta metragem?
ER: Toda vez que filmo a equipe vai por amor, não tem dinheiro envolvido. Às vezes o povo até gasta do próprio bolso, então como retribuição eu tento facilitar para todos. Uma das facilitações para conquistar o povo a fazer o filme é fazê-lo em 3 dias, um fim de semana (com takes extras e fáceis sendo filmados separadamente outros dias). As locações são escolhidas como a equipe é. Por exemplo, um apartamento é da diretora de arte, outro apartamento é de alguém envolvido no filme de alguma forma. Externas são pensadas muito tempo antes, a praça, por exemplo, além de se perto de um dos apartamentos eu observava que ela estava quase sempre vazia, e assim vai. As escolhas vão de lógica à facilitações.
Sei que não me foi perguntado, mas preciso dizer um fun fact. O apartamento do personagem principal foi quase todo montado pela diretora de arte Natália Bittencourt com ajuda de Charlotte Bell. Quando conto isso às pessoas todos se espantam. Eu me espantei quando vi o apartamento ajeitado, porque a maior parte dos móveis não existiam na casa. Quando você assistir o filme veja a construção deste cenário porque é tão real que parece apenas que fomos lá e filmamos.
CP: Os atores já haviam feito outros trabalhos antes? Se sim, quais?
ER: Allyne Pinheiro já realizou algumas peças e curtas metragens e está se formando em Cinema na Faculdade Estácio de Sá. Heder Magalhães é formado em dança na Angel Vianna Escola e Faculdade de Dança e estudou artes cênicas na CAL (Casas das Artes de Laranjeiras), fez algumas peças, curtas e como ator me ajudou em todos os filmes que realizei ou tentei realizar desde que nos conhecemos. Igor Angelkorte em teatro fez “Os Melhores Anos de Nossas Vidas”, de Domingos de Oliveira, direção de Inez Viana, Peer Gynt, de Henrik Ibsen, direção de Adriano Garib, “Sweeney Todd”, de Stephen Sondhein, direção de Paulo Afonso de Lima, “O Casamento”, de Nelson Rodrigues, direção de Inez Viana , “Da Carta ao Pai”, inspirado na obra de Franz Kafka, direção de Alessandra Gelio, “(Des)conhecidos”, dramaturgia e direção dele mesmo entre outros projetos. Recentemente está na novela “Além do Horizonte” na Rede Globo.
CP: Como foi a preparação dos atores na hora de rodas as câmeras?
ER: Existe em mim um grande respeito sobre os atores. Pra mim 50% de um filme reside na existência e performance deles (caso o filme tenha atores). Normalmente nesses casos de pressa que é fazer um curta, nós conversamos muito antes do filme acontecer. As pessoas são ocupadas na vida e se não rolar dinheiro, não tem como fazer muitos ensaios, então você tem que ser certeiro na escolha. Às vezes você acerta, às vezes não. Fizemos duas leituras e um ensaio e meio, algo assim. Na hora de filmar (e antes) com o Heder eu tenho uma cumplicidade no qual em segundos nos entendemos. O Igor me foi apresentado e fico honrado dele aceitar rapidamente e entender o roteiro. Nunca vi alguém tão preciso na hora de atuar. Allyne está no caminho da aprendizagem junto comigo, então sempre confio no que ela faz, acredito nela porque vejo talento.
O importante é que todos fazem o que eu peço e todos tem a liberdade de criar em cima de seus personagens. Há uma liberdade grande no processo de atuação, eu acho que o ator precisa disso, não acho que aplicar fórmulas exatas são funcionais para o caso da excelente arte de atuar.
CP: Tem planos de colocar o curta Simplesmente um Homem em alguns festivais de cinema nacionais?
ER: Já enviei o filme para alguns festivais, ele foi selecionado para o festival Close – Festival Nacional de Cinema da Diversidade Sexual em 2011, mas, além disso, nada mais. Tenho certeza que não foi por sua qualidade geral, tema ou qualquer coisa, mas mais pelo som que não é audível mesmo com caixas de som especiais. Esse é o maior erro do filme e algo que estou solucionando para um próximo. O filme funciona muito no youtube quando muitos ouvem com fone de ouvido. Me dou por satisfeito por enquanto.
Ps: Mesmo que eu quisesse, o tempo do filme já se foi e ele está no YouTube, então vamos para o próximo filme.
CP: Pensa em direcionar roteiros para longas metragens também? Além disso, tem outros projetos para um futuro próximo? Se sim, poderia nos falar um pouco sobre eles?
ER: Tenho roteiros para longas, séries de tv, curtas. Estou idealizando e rascunhando um documentário sobre drag queens, algo que está circulando a minha vida já há alguns anos. Tenho um roteiro que pretendo vender para a HBO Brasil (assunto é segredo), tenho uma web série que precisa de um pouco de dinheiro para acontecer e várias gracinhas na web que filmo e edito sem grandes pretensões. Neste momento estou produzindo dois curtas (Pirata e Futuro indeterminado), os roteiros estão prontos e já estou em conversas com vários amigos que começam a querer se envolver. Tudo no amor é claro, porque dinheiro ainda não veio, mas um dia virá.
‘Pirata’ é uma história de um cara que mora sozinho e recebe todos os dias uma garrafa com recado de amor dentro. E ‘Futuro indeterminado’ é um microfilme sobre duas pessoas conversando sobre o passado (algo de hoje em dia), num futuro que não saberemos perceber. Uma conversa entre um aluno e uma professora.
Éder e Cinema e Pipoca muito obrigado pela oportunidade de falar sobre meu projeto já completado, do processo maravilhoso que é filmar e dos meus próximos projetos. Indico aos que desejam me acompanhar adicionar no Facebook, Twitter, Youtube e curtam as paginas: ‘Simplesmente um Homem’ e ‘Simbologia no Cinema De Paul Thomas Anderson’.
Assistam o curta metragem aqui: