Coralie Fargeat, diretora francesa de 48 anos, já havia feito Vingança, um filme sangrento protagonizado por Matilda Lutz, que criticava a sociedade patriarcal, o fetichismo e a hiper sexualização das mulheres. Ao mesmo tempo, o banho de sangue jorrava com gosto ao longo das quase duas horas de projeção. Contudo, A Substância, seu novo projeto, não só extrapola todos estes itens citados acima, como pontua outros, como: a falta de controle que temos sobre a passagem do tempo, a visão de Hollywood sobre o envelhecimento, o esquecimento dos astros e estrelas e, por fim, como tudo isso os afeta e nos afeta.
O início, na calçada da fama, revela que Elisabeth Sparkle, antes ovacionada, hoje está esquecida – essa é uma sacada e tanto para dimensionar o espectador naquele universo. Há ainda uma caricatura na personalidade do diretor da emissora, bem como toda a estética daquele ambiente, que parece um conto de fadas em um primeiro momento, mas torna-se opressor e agressivo logo em seguida. Falando ainda nessa parte técnica, a mixagem e a edição de som transformam detalhes rotineiros em algo asqueroso (como um almoço onde o menu são camarões), mas essa é apenas a preparação do que está por vir.
Como em todo body horror que se preze, temos regras que mais cedo ou mais tarde serão quebradas, causando problemáticas irreversíveis. E este “renascimento” de Elisabeth na pele de Sue me remeteu ao longa A Mosca (1986), dirigido por David Cronenberg, por sua capacidade de gerar aflição, já que uma sai, literalmente, de dentro da outra. Então, Sue nota que tem o poder da juventude nas mãos e essas doses do medicamento, que deveriam ser precisas e as “trocas de corpos” feitas a cada sete dias, ficam longe de acontecer…
Atrizes se entregam ao papel em A Substância
Demi Moore se despe de toda vaidade e merece prêmios e mais prêmios, pois, entre outras coisas, há uma cena onde Sparkle não consegue se achar bela em hipótese alguma, mesmo maquiada, bem vestida e enquanto todos vemos que há beleza ali – isso acentua mais este desespero ao espectador.
Margaret Qualley é o outro ponto forte por aqui! Os takes no corpo de Sue em seu programa dão a entender que ninguém a vê como um ser único, mas sim como frações (um par de pernas lisas e torneadas, seios volumosos, boca carnuda e assim por diante), tudo para satisfazer essa audiência que tem fetiches específicos e que, muitas vezes, o escondem por trás de uma falácia moralista.
No fim, a diretora e roteirista esfrega em nossas caras que este culto à beleza eterna não é nada mais do que uma ilusão, gerando um absurdo gráfico que, certamente, agradará alguns e desagradará tantos outros. Eu coloco A Substância na lista dos melhores do ano, sem sombra de dúvidas!
Onde assistir A Substância?
O filme segue em algumas salas de cinema pelo país.
Sinopse de A Substância
Elisabeth Sparkle é uma celebridade em decadência que enfrenta uma reviravolta surpreendente ao ser demitida de seu programa de fitness na televisão. Em busca de uma nova chance, ela decide experimentar uma droga clandestina que promete replicar suas células, resultando temporariamente em uma versão mais jovem e aprimorada de si mesma. Essa escolha a leva a um dilema inesperado, à medida que a atriz precisa aprender a conviver com sua nova identidade.
A nova versão de Elisabeth, chamada Sue, traz à tona questões profundas sobre fama e identidade. Ambas devem coexistir, dividindo não apenas o tempo, mas também as experiências e os desafios que a vida pública impõe. O conceito da droga é intrigante: “Já sonhou com uma versão melhor de si mesmo? Você, mas em uma versão aprimorada em todos os sentidos”.
Com um equilíbrio definido pelas regras da droga — uma semana para cada versão — há uma coabitação forçada entre elas provocando não mudanças que ela jamais imaginou.
Nota Cinema e Séries: ★★★★½
Título Original: The Substance
Ano Lançamento: 2024 (Reino Unido | Estados Unidos | França)
Dir: Coralie Fargeat
Elenco: Demi Moore, Margaret Qualley, Dennis Quaid, Hugo Diego Garcia, Phillip Schurer, Joseph Balderrama, Gore Adams