Carolina Markowicz, diretora de O Órfão, curta selecionado para Cannes, bateu um papo conosco e nos contou que estar no Festival “não é apenas uma surpresa, é também um grande sonho ter um filme estreando lá“.
O filme concorre na 50ª edição da Quinzena dos Realizadores. O prêmio foi criado com o objetivo de ajudar cineastas e contribuir para a sua descoberta pelos críticos e pelos públicos.
Segue a entrevista na íntegra:
Cinema e Pipoca: Como teve contato com a história real que deu origem ao filme?
Carolina Markowicz: Na verdade não é especificamente uma história real. Tenho uma amiga que trabalhava em um abrigo e me contou a história de um dos meninos que foi adotado e devolvido. Como nunca tinha ouvido a respeito, me chamou a atenção e acabei conhecendo o rapaz através dela, na época já um homem de 20 anos, gay assumido.
Perguntei a ele se achava que o fato de ser gay teria influenciado na decisão do casal. Ele disse que não sabia ao certo mas desconfiava que sim. Consternada com a história, pesquisei mais a respeito e vi que não era um caso isolado, infelizmente. A história em si não é de uma pessoa específica real, mas o fato de um jovem devolvido por ter tendências homossexuais, é sim, algo que já ocorreu.
CP: Quais as dificuldades e facilidades de se fazer um filme baseado em fatos reais?
Carolina Markowicz: Acho uma grande responsabilidade contar sobre um fato tão triste e profundo. O que ocorre com o personagem do filme no decorrer é ficcional, portanto as dificuldades são as mesmas de sempre. Mas acho que o peso de saber que existem pessoas que passaram por isso é grande, e a necessidade de transmitir essa emoção e comoção, também.
CP: Um garoto negro, pobre, solitário e “diferente”. Existem muitos órfãos como Jonathas espalhados pelo país. Você acredita que toda esta desigualdade um dia acabará ou, ao menos, diminuirá?
Carolina Markowicz: Acho que infelizmente ainda estamos muito longe de ter uma perspectiva mais justa para tantos meninos como ele. Gostaria de ser mais otimista a respeito.
CP: Como ocorreu a escolha do elenco e qual a preparação que os atores tiveram para entrar em seus papeis?
Carolina Markowicz: A produtora de elenco Alessandra Tosi me apresentou alguns atores que julgava serem adequados ao papel. Escolhi o Kauan, pelo carisma e energia e achei que ele tinha tudo para ser o Jonathas forte e carismático que imaginava. Contei com a ajuda de duas preparadoras de elenco infantil, uma delas mais no início do processo e a outra na reta final.
CP: Quanto tempo duraram as filmagens e onde elas foram feitas?
Carolina Markowicz: Três dias em São Paulo e em quatro locações diferentes.
CP: O que é cinema independente para você?
Carolina Markowicz: É o cinema em que a potência da ideia e dos personagens é o principal. O resto se dá em função e a serviço disso.
CP: Você fez Namoro à Distância no ano passado antes deste O Órfão. E os dois falam sobre a solidão e a distância. É um tema que você se sente mais confortável de filmar em suas obras?
Carolina Markowicz: Antes de Namoro fiz também Postergados, e antes Edifício Tatuapé Mahal, junto com Fernanda Salloum e o primeiro foi 69 – Praça da Luz, com Joana Galvão. Todos muito diferentes entre si mas com um elo em comum: o tom, de um humor talvez um pouco mais obscuro.
Acho que na verdade “O Órfão”, apesar do personagem ser irreverente, entra em um tom mais dramático que é uma nova experimentação para mim. Não apenas solidão e distância, mas tudo que se refere ao lado mais obscuro e denso do humano me interessa. Assim como a mistura de tons e de nuances, como contar uma história fundamentalmente dramática com humor, ou o contrário, que é algo que reflete a fascinante inconsistência humana.
CP: Tem outros projetos para o futuro? Poderia nos contar um pouco a respeito deles?
Carolina Markowicz: Estamos captando recursos para meu primeiro longa-metragem, Quando Minha Vida Era A Minha Vida. Um drama/humor obscuro que conta a história de uma máfia especializada em esconder fugitivos no lugar de pessoas em estado vegetativo em casas do interior de São Paulo. Já tem um elenco do qual me orgulho demais: Cesar Bordon, Rita Cortese e Maeve Jinkings e pretendemos rodar o ano que vem.
Agora é ficar na torcida para O Órfão, curta selecionado para Cannes!
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