Quando começaram a escrever À margem de nós mesmos, curta-metragem que aborda as diversas formas de sexualidade, a diretora Luiza de Andrade e o roteirista Leonardo Castelo Branco (do curta Fui Comprar Cigarros) gostariam de contar uma história que fosse além da opção sexual, abordando temas que permeiam o mundo atual: relações abusivas, o vicio em jogo e álcool, doenças modernas, poliamor, sexo com e sem compromisso, problemas no trabalho e outros complexos da vida na cidade grande, no caso São Paulo.
O que eles não perceberam é que, fazendo isso, abordariam o homo e o bissexualismo de maneira natural, colocando o assunto dentro da rotina mundana, diferente do que acontece em grande parte das produções que se arriscam no tema, seja no Brasil ou fora dele.
Após a primeira sessão que aconteceu em uma galeria em São Paulo, a dupla começava a tomar ciência da proporção do que criaram. A plateia, em silêncio, não falava e nem se manifestava, mesmo com as luzes já acessas e a equipe posta a frente da tela para responder as perguntas.
Para surpresa de todos os presentes, uma mulher trans se levantou e quebrou o silêncio: “Vocês sabem o quanto é difícil ver um gay ou trans ser retratado em filmes levando uma vida normal? Nem sempre somos cabelereiros, manicures ou fazemos programa. Queremos e devemos estar dentro da normalidade, sem destaque ou estereótipos, somos pessoas comuns.” Enfim, todos aplaudiram a obra e o coquetel transcorreu de maneira animada.
À Margem de Nós Mesmos nos festivais mundo afora
Logo depois da estreia, o filme entrou no circuito dos festivais nacionais e internacionais. No segundo cenário, tendo mais destaque. No Brasil, estreou no Cine Belas Artes como parte da Seleção Oficial do The São Paulo Film Festival. No exterior, logo de cara passou para a finalíssima de quatro festivais: The 12 Months Film Festival (Romênia), Cap Spartel Film Festival (Marrocos), Lake View Internacional Film Festival (Índia) e LA Cine Fest (EUA).
Na Romênia, país onde informa a Vice, que “de acordo com um relatório de 2010 publicado pela agência antidiscriminação do governo da Romênia, 84% dos romenos se recusariam a beber do mesmo copo que uma pessoa gay”, “Á Margem de nós Mesmos” lidera com certa folga a votação popular do The 12 Months Film Festival que vai até o final do mês de novembro.
Em outros dois festivais internacionais, a máxima foi repetida. No Cap Spartel Film Festival, que acontecerá no Marrocos, país em que o homossexualismo é considerado crime e pode ser castigado com até três anos de prisão, À margem de nós mesmos é um dos selecionados ao grande prêmio. Os idealizadores devem marcar presença no evento que acontecem em abril do ano que vem.
Na Índia, onde o curta-metragem foi selecionado para o Lake View Internacional Film Festival a situação é mais branda, mas não menos perigosa para os homossexuais, a julgar que suas leis para o assunto são dadas como “Incertas” ou “Indefinidas” pela LLGA (sigla em inglês para International Lesbian, Gay, Bisexual, Trans and Intersex Association).
É preciso afirmar que À margem de nós mesmos não é uma obra cheia de nuances, reviravoltas e truques de roteiro. Mas precisa ser vista, pela simplicidade da mensagem que construiu “sem querer”, assim como “A vida é bela” e “Cinema Paradiso” para citar alguns exemplos.
Poesia, inquietude, situações cotidianas e sexualidade se colidem de maneira que, ao menos onde ainda não se tem liberdade de expressão, o cinema é capaz de cumprir suas principais funções: abrir a mente e fazer sonhar.
Você pode ajudar o curta brasileiro votando aqui.