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A 13ª Emenda e o caos do sistema carcerário

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13EMENDA

A questão racial sempre esteve muito presente não só nos Estados Unidos mas em todos os cantos do mundo, pois alguns seres humanos conseguem inferiorizar outros pela cor de sua pele. Ava DuVernay, diretora do excelente ‘Selma – Uma Luta pela Igualdade‘, amplia esta visão em A 13ª Emenda, documentário que concorre ao Oscar da categoria neste ano.

Sua capacidade de interligar os fatos de maneira fácil e precisa, traz ainda mais impacto e a trilha sonora lotada de batidas pesadas e letras confrontadoras, são uma das cerejas deste bolo indigesto. A linha temporal começa lá atrás, na época em que D.W. Griffith cria ‘O Nascimento de uma Nação‘, um dos filmes mais racistas de todos os tempos e pontua que negros eram causadores de todo o mal (desde roubos até estupros) e a Klu Klux Klan seriam os bem feitores.

Após a abolição da escravatura, o governo cria a 13ª emenda, que prevê: “Não haverá, nos Estados Unidos ou em qualquer lugar sujeito a sua jurisdição, nem escravidão, nem trabalhos forçados, salvo como punição de um crime pelo qual o réu tenha sido devidamente condenado.”, num contexto geral, é fácil entendermos o que ocorreu nas décadas seguintes, ou seja, um aumento da população carcerária (representa 25% do total no mundo) e uma diferenciação no modo de tratamento, tanto de policiais quanto dos próprios juízes nas sentenças e na mídia entre brancos e negros.

13ª Emenda

Foto: Poster do filme

As falas de todos os entrevistados, assim como os gráficos apresentados e as cenas históricas de personalidades como Martin Luther King ou Malcolm X, vão de encontro aos interesses de inescrupulosos empresários e da própria corrida presidencial americana. É aí que DuVernay coloca o dedo na ferida sem medo, mostrando como Nixon, Bill Clinton, Hillary Clinton e Donald Trump, jamais se importaram com medidas que, de fato, beneficiassem as classes minoritárias.

A 13ª Emenda vem para provar que se você, homem branco, de classe média e alta, que nunca passou por situações parecidas como essas e nunca fez o exercício de etnocentrismo, jamais entenderá a luta de negros contra o racismo, de mulheres contra o feminismo, de homossexuais contra a homofobia e de tantas outras classes. A venda ainda cega muita gente, mas ainda podemos retirá-la, basta você querer.

Título Original: 13th
Ano Lançamento: 2016 (Estados Unidos)
Dir: Ava DuVernay
Elenco: Michelle Alexander, Angela Davis, Cory Booker, Jelani Cobb

ORÇAMENTO: —
NOTA: 10,0

Por Éder de Oliveira

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Indicações ao Oscar: Melhor Documentário

Primeiro vingador do Cinema e Séries (antigo Cinema e Pipoca) e do Pipocast, sou formado em Jornalismo e também em Locução. Aprendi a ser ‘nerdzinho’ bem moleque, quando não perdia um episódio de Cavaleiros do Zodíaco na TV Manchete ou os clássicos oitentistas na Sessão da Tarde. Além disso, moldei meu caráter não só com os ensinamentos dos pais, mas também com os astros e estrelas da Sétima Arte que me fizeram sonhar, imaginar e crescer. Também sou Redator Freelancer.

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Frankenstein (2025) | Resenha | Vale a pena assistir?

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frankenstein 2025 topo

Eu fiquei extremamente feliz quando soube que Guillermo Del Toro estaria no comando de Frankenstein (2025) para a Netflix. Essa história clássica que, ao longo das décadas, recebeu uma variedade gigantesca de filmes – que vão desde o clássico de 1931, passando pela comédia O Jovem Frankenstein (1974), de Mel Brooks, pelo interessante Frankenstein de Mary Shelley (1994), dirigido por Kenneth Branagh e o ensosso Van Helsing (2004) – merecia uma revisitada.

Lembrando que o histórico do diretor ia a favor dele, já que criou monstros icônicos, como em Hellboy, O Labirinto do Fauno e A Forma da Água, só para citar alguns, ou seja, não teria como errar na criatura, certo? Bem… vamos por partes, pois falaremos disso mais para frente.

Com orçamento de mais de US$ 100 milhões, não só o figurino, como as locações estão perfeitas – tanto a parte de dentro do navio, quanto o laboratório de Victor Frankenstein são reais, ou seja, nada de computação gráfica. Contudo, quando ela chega, seja no ataque dos lobos ou nos planos abertos da cidade e da geleira, temos um deleite visual.

O elenco e o monstro em Frankenstein (2025)

Além de Jacob Elordi como o monstro, vemos Oscar Isaac como o doutor Victor, que se entrega ao papel, Mia Goth, que tem uma personagem que alterna entre momentos densos e outros pouco inspirados – muito por conta do roteiro -, Christoph Waltz, como Henrich Harlander e sua riqueza interminável para apoiar o cientista, algo descabido e pouquíssimo aproveitado no decorrer da história e Felix Kammerer, como o irmão mais novo de Victor.

E você não vai falar do monstro? Se essa interrogação passou pela sua mente, eu comentarei a partir de agora. Andrew Garfield foi o primeiro nome cotado para vivê-lo, mas por conta de sua agenda, precisou declinar, dando espaço para Elordi. Ele, que é um dos atuais galãs de Hollywood, até se esforça e tem boa dinâmica e fisicalidade. Porém, se em diversos trechos Del Toro expõe uma violência crua, na criação deste ícone da cultura ele deixa a desejar. Se Frankenstein é tido como uma criatura horripilante, onde está isso na tela? Ele tem feições belas… e isso me incomodou muito. Faltou coragem para impactar não só a população daquele local, mas também o espectador.

Frankenstein (2025), ao longo de suas extensas duas horas e vinte e nove minutos, é como o personagem criado por Victor, um remendo de coisas interessantes e outras aleatórias, que pode até andar por conta própria, mas faz isso de forma desajeitada e esquisitona.

Frankenstein (2025)
Frankenstein (2025)

Onde assistir Frankenstein (2025)?

Sinopse de Frankenstein (2025):

Um cientista brilhante, mas egocêntrico, dá vida a uma criatura em um experimento monstruoso que acaba levando à destruição do criador e de sua trágica criação.

Nota: ★★★

Título Original: Frankenstein
Ano Lançamento: 2025 (EUA)
Dir.: Guillermo del Toro
Elenco: Oscar Isaac, Christian Convery, Jacob Elordi, Mia Goth, Felix Kammerer, Lars Mikkelsen, Christoph Waltz

Curiosidades de Frankenstein (2025)

O laboratório de Frankenstein e o navio do Capitão Anderson foram construídos fisicamente, sem uso de CGI.

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Jacob Elordi estudou a dança japonesa butoh e o canto gutural mongol para capturar os movimentos e a presença do Monstro.

Elordi passava até 10 horas na cadeira de maquiagem. Às vezes, chegava às 22h e ficava acordado a noite toda para começar a filmar.

O diretor de Frankenstein (2025), Guillermo del Toro, afirmou que Elordi parecia “sobre-humano”, pois nunca reclamou, mesmo em dias de 20 horas de trabalho.

Andrew Garfield foi inicialmente escalado como o Monstro, mas deixou o projeto por conflitos de agenda. O papel passou para Jacob Elordi.

Victor Frankenstein, interpretado por Oscar Isaac, foi concebido por del Toro como uma figura com energia de rock star, inspirado em David Bowie, Mick Jagger e Prince.

O design do Monstro é baseado nas ilustrações do artista Bernie Wrightson, amigo pessoal de del Toro. O diretor licenciou as imagens antes da pré-produção.

Para aliviar o clima sombrio de Frankenstein (2025), del Toro e Oscar Isaac trocavam piadas mórbidas em espanhol durante as filmagens.

Ao contrário dos filmes clássicos, Frankenstein (2025) reconhece que Mary Shelley nunca descreve claramente como o Monstro ganha vida, apenas sugere o uso da eletricidade.

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Del Toro escolheu Frankenstein como sucessor de Pinóquio (2022), pois enxerga as duas histórias como “duas faces da mesma moeda” — a criação e o criador.

Oscar Isaac foi a única escolha de Guillermo del Toro para interpretar Victor Frankenstein.

Isaac e Elordi decoraram seus espaços pessoais com as ilustrações de Wrightson para se inspirarem e “absorverem” a essência da criatura.

Del Toro chegou a considerar transformar a história em três filmes, focando separadamente em Victor Frankenstein, o Monstro e o Capitão Walton.

O filme contém uma cena idêntica a um enquadramento de Death Stranding (2019), em homenagem ao amigo de del Toro, o criador de jogos Hideo Kojima.

Mia Goth interpreta dois papéis: a mãe de Victor e sua amada, Elizabeth Lavenza, simbolizando a conexão entre o amor materno e o romântico — tema central do filme.

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Terror em Shelby Oaks | Resenha | Vale a pena assistir?

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TERROR EM SHELBY OAKS

Há um peso considerável quando um filme de terror vem acompanhado do nome Mike Flanagan, ainda que apenas como produtor. Afinal, Flanagan é sinônimo de horror inteligente, com atmosferas densas e personagens emocionalmente complexos — basta lembrar de A Maldição da Residência Hill e Doutor Sono. No entanto, em Terror em Shelby Oaks, esse selo de qualidade acaba sendo mais um chamariz de marketing do que um reflexo real do resultado final.

O longa, dirigido e escrito por Chris Stuckmann, até começa de forma promissora, mas perde o rumo à medida que tenta conciliar ambição autoral com fórmulas seguras de estúdio.

O primeiro ato de Terror em Shelby Oaks

O primeiro ato é, sem dúvida, o ponto alto da produção. Stuckmann abre a narrativa com uma sequência de found footage que remete diretamente a A Bruxa de Blair. Acompanhamos os últimos momentos de uma personagem desaparecida, e logo a estética muda para um formato quase documental, com entrevistas, depoimentos e materiais de arquivo que constroem o mito em torno dos misteriosos assassinatos de Shelby Oaks, uma pequena cidade americana. Essa abordagem híbrida, misturando realidade e ficção, cria uma aura de mistério. Há um senso de investigação jornalística e paranoia coletiva que prende o espectador — especialmente nos primeiros 40 minutos.

Outro acerto é o design de produção. pois as composições de câmera e a fotografia acinzentada lembram a Pripyat pós-Chernobyl, evocando aquele misto de fascínio e repulsa típico de cidades fantasmas. É um espaço que respira tensão, e o filme acerta ao explorar essa geografia como personagem. A sequência dentro do presídio, filmada em handcam, é um dos melhores momentos — claustrofóbica, imprevisível e angustiante.

E aí vem a metade do filme

Mas o problema é que Terror em Shelby Oaks não consegue sustentar essa força inicial. Quando a narrativa passa a acompanhar Mia Brennan-Walker (interpretada por Camille Sullivan), irmã da garota desaparecida, o roteiro começa a se fragmentar. A personagem até tem motivações compreensíveis — o luto e a culpa a movem —, mas suas atitudes beiram o ilógico. Ela toma decisões tão inconsequentes que acabam rompendo a imersão. O que era para ser uma busca desesperada pela verdade se transforma em uma sequência de escolhas para levar o roteiro adiante.

Esse desequilíbrio é agravado pela direção inexperiente de Stuckmann. Como ex-crítico de cinema, ele demonstra conhecimento teórico de gênero, mas carece de maturidade narrativa. Sabe-se também que, após a Neon comprar os direitos, houve injeção de verba e alterações significativas, incluindo um novo final e o aumento da violência gráfica. Quando ao segundo ponto, acho justíssimo, mas o desfecho é menos ousado, menos autêntico e, em última instância, menos memorável.

Apesar das falhas, o longa não é um desastre completo. O uso de câmeras subjetivas e edição de sons cria momentos de verdadeiro desconforto. Há também uma crítica sutil ao sensacionalismo digital, representada pelos “Paranóicos Paranormais”, o canal de YouTube que explora tragédias alheias em busca de audiência. Essa camada metalinguística é interessante e poderia ter rendido mais se o roteiro tivesse coragem de aprofundá-la.

No entanto, esses méritos isolados não salvam o filme de seu principal defeito: a falta de identidade narrativa. Terror em Shelby Oaks tenta ser ao mesmo tempo um mockumentary, um drama sobre trauma familiar e um terror sobrenatural, mas nunca escolhe qual dessas vozes quer seguir. O resultado é uma obra confusa, que perde força a cada tentativa de agradar todos os públicos.

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E se Flanagan tivesse dirigido Terror em Shelby Oaks?

Se Mike Flanagan estivesse na direção, talvez o resultado fosse outro — mais coeso, mais emocional, mais maduro. Ainda assim, há talento em potencial, e é possível que Stuckmann, em um futuro projeto com maior liberdade criativa, consiga lapidar o que aqui aparece de forma dispersa.

Se vier uma sequência, será mais por interesse comercial do que por necessidade narrativa. E, sinceramente, talvez fosse melhor deixar Shelby Oaks e seus fantasmas descansarem em paz.

Pôster de Terror em Shelby Oaks
Pôster de Terror em Shelby Oaks

Onde assistir Terror em Shelby Oaks?

Sinopse de Terror em Shelby Oaks:

A busca desesperada de uma mulher por sua irmã há muito tempo perdida torna-se uma obsessão ao perceber que o demônio imaginário de sua infância pode ter sido real.

Nota: ★★½

Título Original: Shelby Oaks
Ano Lançamento: 2025 (EUA | Bélgica)
Dir.: Chris Stuckmann
Elenco: Sarah Durn, Camille Sullivan, Sloane Burkett, Brenna Sherman, Caisey Cole, Anthony Baldasare, Eric Francis Melaragni, Michael Beach, Emily Bennett, Ashleigh Snead

Curiosidades de Terror em Shelby Oaks

A campanha de financiamento coletivo de Terror em Shelby Oaks atingiu sua meta inicial de US$ 250 mil em apenas 24 horas.

Todas as metas estendidas — até US$ 1 milhão — foram alcançados antes do fim da campanha, que terminou com US$ 1.390.845 arrecadados de 14.720 apoiadores, tornando-se o filme de terror mais financiado da história do Kickstarter.

Cerca de oito meses após a Neon adquirir o longa, o estúdio financiou três dias de refilmagens que custaram mais de US$ 1 milhão, incluindo cenas mais violentas que não puderam ser feitas com o orçamento original.

O editor Brett W. Bachman (Mandy, Pig) foi contratado pela Neon para dar a Terror em Shelby Oaks uma edição mais “refinada e polida” após as refilmagens.

Em 2020, Chris Stuckmann citou o filme Caçada e elogiou a atuação de Camille Sullivan em um vídeo de seu canal. Anos depois, ela se tornou a protagonista de Terror em Shelby Oaks — um verdadeiro “momento de ciclo fechado” para o diretor.

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As cenas do presídio foram filmadas na Ohio State Reformatory, também conhecida como Mansfield Reformatory, a mesma prisão usada em Um Sonho de Liberdade.

Os portões vistos quando Mia chega à prisão não são os originais — são um cenário remanescente do filme Força Aérea Um (1997), ainda preservado no local.

Em um dos pôsteres promocionais do filme mais de 14 mil pessoas que financiaram a obra foram incluídas como forma de agradecimento.

O termo “succubus” (súcubo) aparece como referência a uma demônia feminina que visita homens durante o sono, imobilizando-os e mantendo relações sexuais — o equivalente masculino é o “incubus”.

A atriz Emily Bennett, que interpreta a diretora do “filme dentro do filme”, é também uma diretora e roteirista de verdade, com trabalhos reconhecidos em festivais.

Apesar das refilmagens financiadas pela Neon, o projeto manteve seu espírito independente, com grande parte da equipe e elenco formada por profissionais que apoiaram o filme desde o início.

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A Memória do Cheiro das Coisas | Resenha | Vale a pena assistir?

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a memoria do cheiro topo

Coproduzido por Portugal e Brasil, A Memória do Cheiro das Coisas é um dos filmes que estiveram na programação da 49ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo. Dirigido por António Ferreira, o longa se revela uma reflexão sobre envelhecimento, solidão, culpa e colonialismo, temas que se entrelaçam em um drama silencioso, quase sufocante, que exige do espectador um olhar paciente e empático. É um filme sobre o tempo — o tempo que corrói, que pesa, que se repete — e sobre a dificuldade de se desprender de tudo aquilo que já passou, mas que insiste em permanecer.

O protagonista Armênio, vivido por José Martins, é um homem no fim da vida que habita um lar de repouso, espaço que se torna um microcosmo de suas dores e fantasmas. Martins entrega uma atuação precisa, contida, quase física, traduzindo em cada gesto a fragilidade e o esgotamento de alguém que já não encontra sentido em existir (e talvez por isso siga fumando excessivamente). Seu corpo cansado, seus movimentos lentos e suas pausas intermináveis revelam muito mais do que as palavras poderiam dizer.

Ferreira opta por longas tomadas e planos fixos, que não apenas retratam o ritmo da velhice (e de outros senhores e senhoras naquele local), mas também impõem ao público uma experiência de imersão no tempo dilatado.

A Memória do Cheiro das Coisas e a claustrofobia do cenário

O lar onde o personagem vive é um ambiente de clausura e esquecimento. As janelas não se abrem, os corredores são longos e silenciosos, e a sensação de claustrofobia é constante. Ferreira faz do cenário um personagem à parte: a arquitetura fria e impessoal reflete a ausência de liberdade e de futuro.

É ali que o simples ato de abotoar uma camisa ou andar até o final do corredor torna-se um desafio gigantesco. A câmera, paciente, registra esses gestos mínimos com respeito e brutalidade, transformando o banal em poético e o cotidiano em metáfora. Apesar disso, ainda senti que poderia haver maior fluidez em sequências específicas, pois o projeto parece ter uma duração maior do que, de fato, tem.

Mas A Memória do Cheiro das Coisas vai além da velhice. Ele mergulha também nas marcas do colonialismo português. Armênio é um ex-soldado que lutou na Guerra Colonial Portuguesa, conflito que levou o exército europeu a lutar para manter o domínio sobre colônias africanas como Angola e Moçambique. Essa experiência deixou nele um rastro de preconceito e desumanização que o acompanha até a morte.

Quando Hermínia, uma nova enfermeira negra, chega à casa de repouso, o velho homem a trata com paternalismo e racismo — chamando-a de “minha pretinha” e tocando-a sem consentimento.

Hermínia, interpretada com sensibilidade e força por por Mina Andala, torna-se o contraponto da narrativa. É através dela que A Memória do Cheiro das Coisas propõe uma possibilidade de reconciliação, ainda que frágil, entre vítima e algoz, passado e presente. O encontro entre ambos não é simples — há violência simbólica, há mágoa, há resistência —, mas também existe ali uma forma silenciosa de compaixão. Hermínia não o perdoa, mas também não o ignora.

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Essa ideia está expressa já no título do filme. pois o “cheiro” é uma metáfora para o passado que se impregna, que não se dissipa, que retorna de maneira inesperada. Armênio é, em essência, um homem que vive cercado por memórias que ele já não pode controlar. Ferreira transforma esse conceito em imagem: o tempo parece se dissolver, os sons tornam-se distantes, e a narrativa, por vezes, se curva à própria lentidão, criando uma atmosfera quase hipnótica.

Subtexto social em A Memória do Cheiro das Coisas

Há também um subtexto social importante: o filme denuncia não apenas o abandono dos idosos, mas também a indiferença familiar e institucional. A família de Armênio pouco se importa com ele — com exceção de um filho que tenta manter algum vínculo —, e essa ausência reflete um ciclo vicioso de descuido e desumanização. Ferreira sugere que, assim como o colonialismo deixou marcas profundas nas relações sociais, a forma como tratamos nossos velhos revela muito sobre o tipo de sociedade que construímos.

O desfecho não oferece redenção fácil nem respostas reconfortantes e se encerra com a mesma serenidade inquieta com que começou, deixando no ar a sensação de que a memória — seja do corpo, da culpa ou da história — nunca desaparece completamente.

Esse colonialismo se segue, e isso pode ser prejudicial, no fim das contas, já que o pai da enfermeira também lutou ao lado dos portugueses. Reparação histórica até a segunda página e, mesmo assim, não dá pra negar que o espectador sairá da sessão de A Memória do Cheiro das Coisas igual.

A Memória do Cheiro das Coisas
A Memória do Cheiro das Coisas

Onde assistir A Memória do Cheiro das Coisas?

Sinopse de A Memória do Cheiro das Coisas:

Diante da vulnerabilidade da velhice, Arménio é obrigado a encarar os fantasmas do passado, enquanto uma amizade inesperada floresce entre ele e Hermínia. Este filme é um retrato poético e intimista de um idoso em um asilo, explorando a fragilidade da condição humana, a inevitabilidade da morte e a busca por redenção. Aborda questões urgentes da nossa sociedade, como o envelhecimento da população e o racismo estrutural.

Nota: ★★★½

Título Original: A Memória do Cheiro das Coisas
Ano Lançamento: 2025 (Portugal | Brasil)
Dir.: António Ferreira
Elenco: José Martins, Mina Andala, Pedro Lamas, Robson Lemos, Maria Manuel Almeida, Maria José Almeida, Sofia Coelho, Paula Barata, José Castela, Cláudia Carvalho

Curiosidades de A Memória do Cheiro das Coisas

  • O filme foi rodado quase inteiramente em uma antiga clínica, que foi transformada em uma casa de repouso para a produção.
  • A cena em que o protagonista, Arménio, se mistura à multidão de manifestantes foi filmada durante uma manifestação real de 1º de maio em Coimbra, Portugal. Elenco, equipe e atores de apoio se integraram discretamente ao evento ao vivo, capturando o momento com o mínimo de intrusão e uma energia autêntica.
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O Beijo do Dragão | Resenha | Vale a pena assistir?

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o beijo do dragao

De tempos em tempos eu venho reassistindo filmes que marcaram, de alguma forma, minha adolescência. E me lembro que adorava O Beijo do Dragão, assim como Romeu tem que Morrer (este segundo ainda não revi), que passavam na Tela de Sucessos do SBT de tempos em tempos. O fato é que, nesta época, Jet Li estava no seu auge em Hollywood, pois, além destes já citados, ainda entraria O Confronto (uma das tantas cópias de Matrix), Contra o Tempo, Cão de Briga (que é divertido) e Rogue – O Assassino, só para citar alguns.

O astro contracena com Bridget Fonda, num casting extremamente aleatório e quase sem nexo. Isso porque o roteiro, escrito a seis mãos por Jet Li, Luc Besson e Robert Mark Kamen, se passa na França e é uma salada indigesta com algumas boas coreografias de luta, ou seja, envelheceu tão mal quanto a carreira da atriz, que não faz nada desde 2002 – após seu casamento com Danny Elfman, resolveu se concentrar no cuidado de sua família.

Dirigido pelo desconhecido Chris Nahon, temos uma peneira como história, pois o casal se conhece num apartamento, onde há um crime e, depois, se reencontram quando ela, uma prostituta, pede para usar o banheiro da loja onde o personagem de Li está. Paris deve ser do tamanho de Monte Mor, interior de São Paulo, não é possível!

Porradaria, mortes e polícia idiota resume bem o que é O Beijo do Dragão

Há sequências bastante violentas, mas há também uma polícia que não faz a menor questão de salvar os civis – em uma sequência dentro de um túnel, o policial atira em todo mundo para tentar acertar nosso ‘herói’. Comparativamente, é interessante notar como o gênero da ação mudou em pouco tempo, pois aqui, Hollywood ainda era influenciada pelos heróis brucutus, das décadas de 1980 e 1990, contudo, um ano depois chegaria Identidade Bourne e tudo ficaria mais real e ‘pé no chão’.

O que resume bem O Beijo da Dragão é a luta de Jet Li contra os irmãos gêmeos dentro de uma espécie de escritório. Aquilo é o suprassumo da breguice – as mesas atrapalham a movimentação e a dinâmica de luta de um deles… a gente tem que rir mesmo. Enfim, essa é uma das tantas obras que merecem permanecer em nosso imaginário, pois é difícil de chegar até o final.

O Beijo do Dragão
O Beijo do Dragão

Onde assistir O Beijo do Dragão?

Sinopse de O Beijo do Dragão:

Liu Jian, um agente secreto chinês em missão diplomática em Paris, vira alvo de uma armação sangrenta quando testemunha acidentalmente o assassinato de um político por policiais corruptos.

Nota: ★★

Título Original: Kiss of the Dragon
Ano Lançamento: 2001 (EUA | França)
Dir.: Chris Nahon
Elenco: Jet Li, Bridget Fonda, Tchéky Karyo, Ric Young, Burt Kwouk, Max Ryan

Curiosidades de O Beijo do Dragão

O Beijo do Dragão teve bilheteria de US$ 64,4 milhões e um orçamento de US$ 25 milhões.

O diretor Chris Nahon precisou desacelerar a luta entre Jet Li e Cyril Raffaelli porque eles se moviam rápido demais para a câmera capturar com clareza.

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Cyril Raffaelli conseguia fazer a acrobacia de um salto mortal para trás com chute sem o uso de cabos.

O estilo de luta do filme foi inspirado em comentários de fãs no fórum oficial de Jet Li, pedindo combates mais realistas, como em Lutar ou Morrer (1994).

Em uma cena com Max Ryan (Lupo), Jet Li o atacou sem o diretor dizer “corta” após o diálogo, e a reação assustada do ator foi tão real que foi mantida no filme.

A cena em que Jet Li é emboscado por policiais franceses acontece no mesmo túnel da Ponte de Alma, em Paris, onde a princesa Diana faleceu.

Apenas duas cenas usaram efeitos digitais: quando Jet Li cai no duto de lavanderia em chamas e quando ele chuta a bola de sinuca no hotel.

Durante entrevistas de divulgação, Bridget Fonda e Tchéky Karyo declararam estar impressionados com as habilidades de Jet Li nas cenas de luta.

Foram usados apenas 7 cabos para acrobacias em todo o filme.

A tartaruga que Richard guarda na gaveta era, na verdade, o animal de estimação de um dos membros da equipe técnica.

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A placa do táxi que leva Jet Li no início é “5080TAG4”, o que pode ser lido como “sabotage” – uma dica sobre o que está por vir.

Esse foi o primeiro filme dirigido por Chris Nahon.

Na ficha do orfanato, a filha de Jessica se chama “Isabel Kamen”. Isabel é o nome verdadeiro da atriz mirim (Isabelle Duhauvelle) e Kamen é o sobrenome do roteirista (Robert Mark Kamen).

Na cena com o Arco do Triunfo, as árvores aparecem sem folhas, mas nas cenas internas do táxi, elas têm folhas — indicando uso de imagens de arquivo.

Burt Kwouk (tio Tai) atuou em três filmes de James Bond. Tchéky Karyo participou de GoldenEye (1995).

Em uma cena, Tchéky Karyo pergunta a Bridget Fonda se ela escapou pela janela, o que remete a La Femme Nikita, filme que ele estrelou, e ao remake americano Point of No Return, estrelado por Fonda.

A maioria das lutas foi realizada por Jet Li, sem substituição por dublês.

Antes do lançamento, o filme quase recebeu o nome de The Red Dragon, mas foi alterado para evitar confusão com outras produções.

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