Você assiste filmes pelo Tik Tok?
Como é possível que alguém consiga assistir filmes pelo Tik Tok? Compreendo que o ingresso nos cinemas está caro, que não é sempre que temos paciência ou tempo para buscarmos algo nos streamings e muito menos na TV aberta ou fechada (isso aí é quase item de museu atualmente).
Criei este conteúdo pois, há alguns dias atrás, conversando com uma pessoa, ouvi dela o seguinte: “ainda não vi o filme, mas já sei tudo o que acontece, porque assisti cenas no Tik Tok“. Primeiramente eu entendo que essa rede social não dialoga com minha geração (já estou chegando aos 40 anos), mas essa é outra perspectiva de que, se não tomarmos certos cuidados, teremos um futuro de cidadãos impacientes e frustrados.
Conforme citado por Pablo Ferreira Bastos Ribeiro, PhD em Psicologia: “Estudos* recentes apontam uma correlação entre a dificuldade de concentração e o uso indiscriminado de telas e redes sociais. No entanto, é fundamental compreender que o problema não reside nas telas em si, mas no excesso de tempo dedicado a elas. Mais do que um efeito causado pelo excesso de estímulos, a questão parece estar relacionada à forma como se constrói a relação com o tempo. Nas redes sociais, o tempo é acelerado: textos longos e profundos têm menos chances de prender a atenção do usuário em comparação com conteúdos mais curtos e diretos. À medida que mais pessoas se adaptam a esse modelo, ocorrem não apenas mudanças culturais, mas também alterações orgânicas, que impactam a forma como interagimos com os meios de comunicação, muitas vezes em detrimento de estratégias mais reflexivas e profundas. Nesse contexto, é essencial destacar que fatores ambientais podem influenciar e até mesmo modificar aspectos biológicos“.
Mais detalhes sobre assistir filmes pelo Tik Tok
Um longa metragem é fruto de muito trabalho, com horas de criação de roteiristas, análises feitas por atores e atrizes para entrarem em seus personagens, montagem, fotografia, figurino e etc. e isso não deve e nem pode ser resumido a essas migalhas.
O psicólogo Pablo segue comentando que: “Precisamos encontrar estratégias para desacelerar. Sem dúvida, uma relação mais saudável com as artes pode contribuir significativamente, mas não se trata de um contato superficial. A forma como interagimos com uma obra — seja uma instalação, uma performance, um romance ou um filme — é essencial. Ver e apreciar são experiências distintas, e, infelizmente, a crescente dificuldade de nos desconectarmos das telas tem comprometido essa vivência. Não é raro, por exemplo, observar pessoas no cinema usando o celular durante a exibição de um filme, como se estivessem ali, mas não por inteiro. Essa presença fragmentada dificulta a capacidade de se envolver e ser genuinamente afetado pela arte“.
É necessário saber controlar a ansiedade, buscar um dia de folga, por exemplo e, aí sim, conferir esse projeto. Outro detalhe é o seguinte: se estiver falando de Venom, Madame Teia ou outras besteiras, ok. Mas não devemos fazer disso algo normal e costumeiro.
A Sétima Arte não deve ser resumida a cortes dentro de uma plataforma com vídeos de 30 segundos.
Outras perguntas feitas para Pablo Ferreira Bastos Ribeiro, PhD em Psicologia
Quais são os danos que esse problema pode causar a curto e longo prazo.
Entre os diversos impactos de uma relação não saudável com as telas e as redes sociais, tenho observado, a curto prazo, um aumento significativo da ansiedade. A necessidade constante de respostas imediatas parece tornar inviável a capacidade de esperar e de viver em um ritmo mais sereno. No entanto, é fundamental compreender que a vida se constrói por meio de processos que exigem paciência — seja para superar o luto pela perda de alguém querido, seja para permitir que o corpo se recupere após uma cirurgia.
A longo prazo, preocupa-me como a sociedade se ajustará a essa aceleração constante do tempo. Não duvido de nossa capacidade de adaptação — afinal, somos resilientes e temos senso crítico para reavaliar nosso estilo de vida em busca de mais qualidade no tempo vivido. Ainda assim, esse será, sem dúvida, um desafio significativo.
Isso afeta crianças de maneira diferente (ou mais grave) dos adultos, por elas não estarem completamente formadas?
Não conheço estudos que façam essa comparação, mas é muito provável que sim. O desenvolvimento neurológico humano ocorre até aproximadamente os 20 anos, e a região do cérebro responsável pelas funções executivas — incluindo o controle inibitório e a flexibilidade cognitiva, essenciais para gerenciar impulsos e compreender regras — é a última a amadurecer. Isso significa que há diferentes níveis de maturidade para lidar com os riscos e prejuízos associados ao uso excessivo das redes sociais e das telas.
No entanto, é fundamental lembrar que o problema não está nas telas em si, mas no uso excessivo e na falta de variedade nos estímulos que recebemos. É essencial cultivarmos experiências que envolvam atenção plena e contemplação, como apreciar por longos minutos uma pintura, assistir a um filme com total envolvimento, imergir nas páginas de um bom romance ou simplesmente nos entregarmos ao contato com a natureza. Podemos ganhar muito quando trocamos a ansiedade de chegar pelo prazer de estar a caminho.
*Stothart, C., Mitchum, A., & Yehnert, C. (2015). The attentional cost of receiving a
cell phone notification. Journal of experimental psychology: human perception and
performance, 41(4), 893 e da Silva, C. P. (2024). CONCENTRAÇÃO DISPERSA E NOMOFOBIA NO ENSINO SUPERIOR. ARACÊ, 6(4), 17455-17473.